Loteamentos irregulares causam desorganização de vias, afetam a prestação adequada de serviços públicos, podem gerar problemas socioambientais e encarecem as contas públicas, ante a rotineira necessidade de instalação de infraestruturas básicas em espaços com ocupação consolidada, mas desprovidos de equipamentos de saneamento, iluminação, dentre outras carências.
Justamente por isso, o art. 37 da Lei n° 6.766/1979 proíbe a venda, ou promessa de venda de parcela de loteamento ou desmembramento não registrado em todo o Brasil. Tal previsão torna nulo o contrato que trate de alienação de imóvel irregular, consoante incisos II e VII do art. 166 do Código Civil:
Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: (…)
II – for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; (…)
VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Por envolver uma questão de nulidade, a alegação de que o comprador sabia da irregularidade não valida a compra e venda firmada entre as partes.
Em recente decisão, a Terceira Turma do STJ reafirmou esse entendimento:
A compra e venda de loteamento não registrado é nula, independentemente de ter sido firmada entre particulares que estavam cientes da irregularidade do imóvel no momento do negócio jurídico.
STJ. 3ª Turma. REsp 2.166.273-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/8/2024 (Info 829).
No caso julgado pelo STJ, os Ministros desconsideraram o argumento da vendedora do lote irregular de que o comprador tinha ciência da irregularidade do bem e, portanto, questionar a compra em juízo configuraria venire contra factum próprio.
No acórdão, os julgadores compreenderam que, além da nulidade do negócio jurídico, a prática de venda de loteamento irregular pode redundar no locupletamento ilícito em prejuízo aos adquirentes das glebas- em regra, pessoas de baixo nível econômico e educacional que alimentam o sonho de uma casa própria-, em razão da ausência da necessária contraprestação de infraestrutura mínima exigida pela legislação. Em paralelo, tal negócio jurídico também geraria ônus ao poder público, para realizar as medidas de regularização formal e de infraestrutura no local, as quais, como visto, seriam de responsabilidade do loteador.
Ante o exposto, recomendamos que a compra e venda de bens imóveis seja precedida de profunda verificação sobre a regularidade do bem posto em negociação, garantindo-se a inexistência de débitos ou pendência contra terceiro, ou, se existindo, ao menos que o valor da alienação já considere tal cenário.
A judicialização da rescisão de contrato de compra de imóvel, embora bem-sucedida a depender do cenário, pode trazer dores de cabeça para todos os envolvidos, além do bloqueio ou inutilização do bem objeto de disputa durante o tramitar do processo judicial.
Links úteis:
Lei n° 6.766/1979. Dispõe sobre o parcelamento do solo urbano. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6766.htm.
Código Civil. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm